O Conselho Municipal de Educação (CME) de Vitória da Conquista está envolvido em uma rede de irregularidades que desafia os limites da legalidade. A crise institucional que se arrasta há anos atingiu um novo patamar, com conselheiros cujo mandato já expirou há meses, mas que continuam exercendo suas funções como se o relógio tivesse parado.
Não bastasse o problema com a permanência ilegal de conselheiros, há denúncias de que o CME tem sido utilizado para favorecer uma empresa cujo dono é membro do próprio Conselho. O favorecimento se daria com a ajuda de parceiros estratégicos e até mesmo de familiares de conselheiros, que ocupam cargos administrativos dentro do órgão, consolidando um esquema que se assemelha a um verdadeiro feudo administrativo. Tudo isso às claras, com a complacência do Governo Municipal, que parece fechar os olhos para o que acontece no órgão fiscalizador da educação.
A situação financeira no CME também é objeto de escândalo. Considere, por exemplo, o caso de um conselheiro que recebeu mais de 7.000 reais em um único mês de jetom – uma compensação financeira pelos trabalhos prestados ao Conselho, que atualmente garante o valor de 100 reais, mas que na época do fato era menos da metade desse valor. O mais curioso? Segundo os registros oficiais, esse conselheiro trabalhou incansavelmente em todos os 31 dias do mês. Outros conselheiros também foram agraciados com quantias generosas, levantando dúvidas sobre a real necessidade e legitimidade desses pagamentos.
O golpe mais recente na credibilidade do CME veio durante o processo eleitoral para presidência e vice-presidência, um evento que deveria ser marcado pela transparência e respeito ao regimento interno do órgão. Denúncias de irregularidades surgiram ainda antes do resultado da votação, mas a Comissão Eleitoral simplesmente ignorou as queixas, prosseguindo com o processo como se nada tivesse sido reportado. Em setembro, o pleno do CME chegou a votar pela anulação do processo eleitoral devido às falhas gritantes. No entanto, em um movimento que beira o absurdo, essa decisão foi desconsiderada e a única chapa envolvida nas eleições marcadas por irregularidades foi empossada de qualquer forma, em flagrante desrespeito ao próprio regimento do Conselho.
Na última reunião, realizada na quarta-feira (16), mais uma denúncia surgiu, desta vez com palavras fortes como “extorsão” e “formação de quadrilha”, o Simmp reforça: poderia ser incluído “peculato”. A autora da denúncia, conselheira de honra, apresentou resultados de uma investigação que expôs as ilegalidades que há muito tempo vêm sendo perpetuadas dentro do CME, e que são deliberadamente ignoradas pelo Governo Municipal. As acusações apontam para o uso do CME como instrumento de favorecimento político e financeiro, transformando-o em uma peça de tabuleiro controlado pelo poder local.
O Sindicato do Magistério Municipal Público de Vitória da Conquista (Simmp), tenta ser uma força atuante dentro do CME, mas tem sido uma voz silenciada nesse cenário. Sempre voto vencido, o sindicato tenta de todas as formas moralizar o Conselho, mas esbarra no aparelhamento e na resistência interna. No entanto, o Simmp não está disposto a recuar. Apesar de relutar em recorrer às instâncias judiciais, o sindicato já sinalizou que, pela defesa da legalidade e da educação pública, está preparado para acionar todos os níveis do judiciário, se for necessário. Afinal, se o CME continuar a operar na ilegalidade, o único caminho possível será a batalha jurídica.
A crise no Conselho Municipal de Educação de Vitória da Conquista não é apenas um reflexo da má gestão; é um exemplo claro de como interesses individuais, governamentais e privados podem distorcer o propósito de um órgão criado para proteger e promover a educação. Enquanto a situação não for resolvida, o CME continuará sendo um espaço onde a legalidade é apenas uma sombra distante.
Confira a carta da Conselheira de honra, Arlete Dória, responsável pelas denúncias apresentadas, que solicitou a publicação na íntegra nos meios de comunicação do Simmp:
Venho por meio desta explicar a todos, (membros do Conselho Municipal de Educação de Vitória da Conquista e convidados, além da sociedade conquistense) que zelam por uma educação verdadeiramente referenciada, que na tarde de ontem (16 de outubro de 2024), na sessão do Pleno, agi com intempestividade, mas afirmo estar com total sanidade mental e seriedade no que pesquiso e enfatizo que o meu comportamento na sessão refletia a minha indignação por tentarem calar a minha voz, me tirando o direito que tenho de fala, assegurado pela Lei do Sistema como conselheira de honra, tentando coibir as apresentações das denúncias, por mim apresentadas, que foram varridas para debaixo do tapete, apenas com um parecer “INCONCLUSIVO”, como foi chamado pelo procurador que o fez, cheio de inconsistências em relação aos documentos que enviei aos diferentes setores, sendo o mesmo ouvido por todos os presentes, tendo uma gravação “AUTORIZADA NO PLENO” para garantir que a ata fosse, detalhadamente produzida.
Enfatizo ainda que, mesmo com a “orientação de uma posse provisória” uma vez que o Parecer Jurídico da Procuradoria afirma a necessidade de outros elementos para dar um parecer conclusivo, o ato da posse foi ilegal, e dadas as evidências ontem apresentadas, podemos dizer também imoral, com o descumprimento da Lei 1.885/2013, bem como o favorecimento de ações que podem ser enquadradas no código penal. Fato que exige revisão e tomada de providências de outros órgãos da fiscalização, da polícia, bem como da administração, por envolver: uso indevido de recursos públicos, favorecimento no setor de trabalho, etc., podendo reverberar em processos administrativos de servidores envolvidos.
Diante das inferências e as autoacusações dos próprios conselheiros que fizeram uso das falas após as minhas denúncias, as manobras no âmbito do CME ficaram ainda mais claras, dispensando até as provas ora apresentadas por meio de documentos de órgãos oficiais, entre outros documentos que foram encaminhados por diversos setores que têm cadeiras no CME, documentos esses que foram debatidos no Pleno, mais uma vez, reforçando a indignação e perplexidade de todos, mesmo alguns membros do governo que fazem parte do Pleno.
Peço desculpas aos visitantes presentes na sessão pela minha intempestividade, em alguns momentos necessária, para impor o meu direito de fala preconizado pela Lei do Sistema como conselheira de honra. Também a alguns conselheiros que, apesar de terem votado pela continuidade da ilegalidade, foram induzidos a votar ou por pouca informação à legislação que respalda o CME ou tem pouca informação acerca dos processos decorrentes das ilegalidades cometidas no âmbito desse órgão e assim não sabem que respondem por elas junto com quem as comete, podendo inclusive responder criminalmente.
Parabenizo pela forma consciente com a qual fizeram suas inferências todos os que, mesmo não sendo conselheiros estivem presentes e se manifestaram contra os atos ilegais e em especial as conselheiras que votaram contra a continuidade dos atos ilícitos (Lenira Figueiredo/DIREC e Simone Marques/SIMMP), pois sabem exatamente no que votam sem a necessidade de sentirem-se coagidas a passarem por cima da ética que as conduz.
Sinto muitíssimo por vários membros que do CME participam, validando por muito tempo os atos que podem gerar problemas gravíssimos para saúde desse órgão, bem como para toda a educação conquistense, pois estando em um Conselho como o CME necessitavam se atentar às regulamentações da Lei n⁰ 1.885/13, que o dá natureza própria com funções consultiva, deliberativa, fiscalizadora e mobilizadora e sendo assim nem precisaria de um parecer por órgãos do Governo para garantir que cumpra a lei.
Muitos membros, por anos, mesmo constando as prerrogativas da lei acima destacada, têm se prestado a um papel contrário ao princípio da legalidade, legitimidade e imparcialidade, mobilizando também de forma desfavorável à ética, à moral e aos bons costumes de um histórico que ficou no passado com a gestão de saudosos ex presidentes com destaque ao professor Luiz Ibiapaba, que com muita lisura e democracia trabalhou árdua e seriamente por um CME honesto, sem aparelhamento e respeitoso, como esperamos que assim volte a ser.
Enfatizo que as funções do CME, preconizadas na Lei 1884/2013 são justamente para não promover o aparelhamento presenciado na sessão de ontem e reafirmo meu pesar pelo que pode acontecer com os servidores públicos que se envolvem nas ações denunciadas.
Termino com a certeza de um dever cumprido, deixando para reflexão o papel de cada um nos órgãos de controle social que objetivam o rompimento e a separação da “concepção e execução, entre o pensar e o fazer, entre teoria e prática e deve resgatar o controle do processo e do produto do trabalho pelos educadores.” ( Veiga, 2002 ).